Finda a reunião no Café Central, já a manhã despontava de uma noite gelada. Tudo se resolveria com a ida à capital, estavam convencidos aqueles dois, Nanixe e Chixe. O primeiro, inebriado pelo tinto e pela conversa assaz demorada – quase monólogo de Chixe –, espalhou-se na calçada como trapo, mal vislumbrou os primeiros raios de claridade e o orvalho que rapidamente lhe sistematizou as pestanas, fazendo ressaltar-lhe um ar de compenetrado filósofo, simultaneamente perturbado e incrédulo pela situação que acontecera.
– É só um vareio da cabeça e passa depois de alguns instantes.
No pensamento desenvolto de Chixe era tão só uma fonte pasmada de tantas estrelas que ainda conseguia descortinar no céu, tal como afirmara o amigo, e depois tudo viria ao lugar após umas horas bem dormidas. O desgraçado não dizia coisa com coisa. Amigo chegado, e como tal sem hesitações, apesar dos movimentos ambiguamente soltos, faz-se ao corpo do tombado com as forças que julga ter e, azar dos azares, esbardalha-se igualmente no chão da rua que os devia levar às suas casas, deixando o Nanixe perdidamente solto sem qualquer amparo: pernas escancaradas, fletidas mais ou menos em ângulo reto, conseguindo, no entanto, manter algum equilíbrio, enquanto se olhava surpreendido por tal proeza, dadas as circunstâncias. Com o auxílio dos braços em movimentos mais parecidos aos sinaleiros de antigamente, assim se manteve naquela suspensão por momentos. Mas logo se desconcentrou, infelizmente, e o peso maldito, também ele, influenciou a deslocação do centro de gravidade do seu corpo e, mais uma vez, num esticão de uma das pernas que julgara fincada, projeta-se para cima da estendedura do amigo, precisamente por cima da barriga, o que lhe provocou forte baforada e a projeção de alguns pedaços mal digeridos de azeitonas, numa mistura engrolada, sobejamente aziumada, a constatar-se pela reação do dono do café, nariz torcido de odores que, num rompante piedoso, transmite aos prostrados que mandará vir o táxi da vila. Cumprida a missão, deita-se refastelado, pois já logo é outro dia!
Chixe e Nanixe, zangado e esbaforido
Chixe e Nanixe, zangado e esbaforido
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