Duas horas dormidas e o dono do café, já a pino e bem desperto, limpava sujidades naturais e resquícios da conversa que sucedera por toda a noite entre os comparsas Chixe e Nanixe, abrindo de seguida a porta do estabelecimento comercial, vendo aqueles dois ainda estremunhados e apoiados na geladura de alguns arbustos de igual modo acabrunhados.
Ouve-se neste momento o roncar do carro de aluguer que chega finalmente e estaciona uns metros em frente à porta do café central. Enquanto ali se dirige o taxista para o mata-bicho, Nanixe, num rompante, levanta um dos braços com a energia que lhe resta e, zangado e esbaforido, dá contudo sinais de forças suficientes que o levarão a casa, não muito longe dali. Ainda cambaleando, lá se vai rua abaixo acelerado pela lei da gravidade, interrompendo-se assertivo ao poste onde costuma aliviar-se. Ali permaneceu encostado durante alguns minutos até retomar a caminhada junto aos pensamentos do amigo e das caganitas dos animais do rebanho.
Entretanto, Chixe num vislumbre do táxi, por entre os primeiros raios de sol que lhe ofuscavam as visões, a ele se dirige determinado, e convicto na certeza de que há-de, pelo tino, acertar na porta do pendura. Mas com tanta caganita a ocupar a maior parte do entendimento e confuso ainda por via da forte azia provocada pela acidez das azeitonas, vai sim de encontro ao puxador da porta traseira, contrária à do condutor. De facto, Chixe não deixava de ter razão: o seu sentido de orientação não se deteriorara com a noite mal dormida, sabendo de antemão que aquela porta era a que mais se aproximava da sua morada e assim para lá estaria voltado o carro que o transportaria. Sem grandes hesitações, Chixe sobe trôpego ao banco de trás, emporcalhando-o com a terra solta que se despega das botas. Após alguns balanços, consegue finalmente sentar-se derreado na parte superior do encosto do banco da frente, nessa posição contrária às regras da ergonomia. Olha de soslaio a porta do café de onde nesse momento sai o motorista e, naquela posição “confortável”, com o braço e mão esquerda, faz-lhe um gesto altaneiro, indicador de quem não tem paciência para esperar. O taxista, acostumado à clientela, responde-lhe com indiferença num maneio de cabeça.
Novo ronco do automóvel, envolto agora numa grande fumaça de gasóleo mal queimado, lá se vão os dois de costas voltadas, não compreendendo Chixe se a desenvoltura vai direitinha ou se pelo contrário ainda manobra para a retaguarda.
Fonte inspiradora de Chixe
Fonte inspiradora de Chixe
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