A casa da máquina de meu avô Zeferino
por José Ribeiro
Ruínas da Casa da Máquina, em Vilar de Maçada |
A história da «Casa da Máquina», como era conhecida uma destilaria de aguardentes vínicas fundada por meu avô materno Zeferino Alves Rodrigues, começa em Parada do Pinhão, no vizinho concelho de Sabrosa, donde meu avô era natural, sendo seu pai e meu bisavô, Rodrigo Rodrigues Alves, Juiz de Paz e correligionário de António Teixeira de Sousa de Celeirós, casado em Sanfins, último Primeiro Ministro da monarquia com D. Manuel II.
O meu avô, por volta de 1910 mudou-se com a família toda para a vizinha
povoação de Vilar de Maçada (a minha mãe e meus tios e tias eram tão crianças
que sempre se consideraram vilarmaçadenses, tendo já aqui nascido os dois mais
novos, César e Cassilda). Essa curta «emigração» que iria ditar o destino da
nossa família deveu-se a uma razão muito pragmática: A freguesia de Parada do
Pinhão está fora da Região Demarcada do Alto Douro e por conseguinte não lhe
era possível na sua terra natal desenvolver os negócios que tinha em vista e
logo ali ao lado situa-se a de Vilar de Maçada que está inserida na Região
Demarcada.
Aqui fundou o meu avô, em meados dos anos vinte, uma destilaria de aguardentes
vínicas que foi algo pioneira na época e pôs de boca aberta os vilarmaçadenses
que nunca tinham visto um alambique daquelas dimensões, implantado num também
avantajado casarão de que ainda restam ruínas, ficando desde logo designado
como a «Casa da Máquina». Escolheu muito bem o local, junto à estrada que
segue para Sanfins do Douro, para Favaios e para o Pinhão, portanto nas rotas
do Douro Vinhateiro afim de poder circular com os vinhos e aguardentes dentro
da região demarcada como é de lei. Também escolheu um local apropriado para a
instalação da destilaria, nas margens de um regato com bastante caudal, já na
saída de Vilar de Maçada para a Sanradela, pois uma destilaria como aquela
iria necessitar de muita água para a sua laboração.
Fez fortuna com este empreendimento pois os vinhos correntes que sobravam da
feitura do vinho fino (ou vinho tratado ou vinho generoso, nomes por que é
designado ainda hoje o vinho do Porto na região do Douro), esses vinhos de
pasto como então eram nomeados os vinhos de mesa, eram nessa época vinhos com
um baixíssimo valor no mercado e em anos de maiores produções nem mercado
tinham. Claro que meu avô comprava esses vinhos sobejantes e ao comprá-los era
uma benesse para os pobres viticultores, pois, se não houvesse a sorte de por
uns patacos irem abastecer as pipas e os garrafões das tavernas da região, o
destino mais certo desses vinhos era o fundo de uma valeta. Destilando-os,
abastecia de aguardentes vínicas as firmas inglesas para a feitura dos vinhos
do Porto. Este negócio era feito ou directamente ou em conjugação com um outro
grande senhor da vitivinicultura e dos negócios de vinhos finos desse tempo
que era o seu amigo Manuel Serôdio, natural de Paços de Sabrosa.
Esta destilação e este negócio era livre nessa época mas a partir dos meados
dos anos trinta, com a acção da Casa do Douro, instituída em 1932, a
distribuição das aguardentes passou a ficar controlada, assim como o direito à
beneficiação dos vinhos para vinho do Porto. A própria produção, uso e
distribuição das aguardentes vínicas passaram a ser controladas pela referida
Casa do Douro e pelo Instituto do Vinho do Porto, havendo mesmo novas
destilarias de aguardentes vínicas entretanto instaladas e geridas pela
própria Casa do Douro. A partir daí a destilaria de meu avô foi ficando sem
futuro.
Apesar de tudo foi-se mantendo em actividade por contratos com a própria Casa
do Douro como destilaria de recurso e já com o seu controlo. Com o falecimento
de meu avô em 1952 foi herdada pela minha tia Cassilda Rodrigues e meu tio,
seu marido, Paulino Morais que ainda a manteve em funcionamento por alguns
poucos anos.
Atualmente restam umas grandes paredes em ruínas como se observa na imagem.
Todavia estes «muragalhos» transportam-nos para uma época pioneira na história
do Alto Douro e na história desta minha freguesia que nesse tempo não estava
tão desertificada de gente como está hoje, pois ainda havia padarias,
ferradores, carpinteiros, tanoeiros, cesteiros, carreiros, etc.
E havia esta «Casa da Máquina» de meu avô, pioneira das destilarias de
aguardentes vínicas no nosso Alto Douro Vinhateiro.
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