O casamento trinta anos adiado
por José Ribeiro
Capela de Cabeda |
O casamento trinta anos adiado da Maria da Fonte com o Herculano do Côto
Esta Maria da Fonte nada tinha a ver com a heroína do Alto Minho do tempo da Patuleia. Mas foi também a heroína de uma comovente história de amor passada ao longo da segunda metade do século passado.
A Maria da Fonte era uma bela mulher de Cabeda. Ainda a conheci muito bem, já mulher madura. Foi sempre uma bonita mulher, elegante, aloirada e de porte senhorial, apesar da dureza da vida de aldeia, no ganha pão do dia a dia. Tanto mais com quatro filhos para criar, filhos do seu amado Herculano Ribeiro, mais conhecido por Herculano «do Côto», nome de um bairro da aldeia, bairro de bons artífices e de exímios caçadores.
Tempos desgraçados aqueles! Jornas de cinco mil réis, mal davam para a brôa que daria um bocado de «sustância» ao caldinho da ceia... E o Herculano, a certa altura, mais precisamente no ano da graça de 1947, resolveu botar-se a emigrar para terras de África, a fim de tentar melhor sustento. O filho mais novo, Amândio, o estimadíssimo carteiro da nossa freguesia, ainda era de colo. Com a promessa solene de voltar com melhoria de vida e casar com a sua Maria, naturalmente.
E os anos foram passando... Décadas passaram e o Herculano já quase andava esquecido nas memórias das gentes da aldeia. Menos na ideia da Maria da Fonte, sempre a suspirar pelo seu Herculano que a paixão era profunda e o seu coração ia-lhe confiando que um dia ele haveria de voltar... e casar com ela de papel passado e de padre na Igreja.
Eu próprio me lembro bem da Maria da Fonte a confidenciar, em conversas de lareira com a tia Maria Teresa, caseira da Quinta de Fornos, esse seu desejo e essa sua paixão.
E tanto deve ter rogado ao destino que essa antiga promessa se concretizasse, que nos finais dos anos setenta e já com sessenta e cinco anos de idade, o Herculano sempre voltou! Com um ar bem apessoado e relativamente remediado da sua vida, sim senhor, apresentou-se perfeitamente predisposto para casar e assim cumprir uma promessa tão antiga e tão sagrada! Casaram pelo civil e estava marcado com o Sr. Padre Hermínio, pároco da freguesia, que dentro dos 90 dias do prazo que a «papelada» impõe, o respetivo casamento religioso se iria realizar na Capela de S. Pedro e Sª Bárbara, em Cabeda, para assim se cumprir em pleno aquela promessa tão antiga.
Só que o homem põe e Deus dispõe. O Herculano parecia saudável mas os seus dias estavam-lhe contados e já não durou o mesmo prazo dos «papéis».
É óbvio que a Maria ficou destroçada. De qualquer modo a Maria da Fonte, que lhe sobreviveu mais alguns anos, pôde viver os últimos anos da sua vida, com a satisfação de ter valido a pena aquela espera apaixonada de trinta anos por um casamento prometido e, que, afinal de contas, acabou por ser meio cumprido!
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