Mirandelês
Um livro de quatro transmontanos
por Barroso da FonteFoto dos quatro transmontanos inserida no "Mirandelês" |
Somos agradavelmente surpreendidos com um volume de 300 páginas, cheias como um ovo, de palavras, expressões e seus significados locais, pois nem sempre essas mesmas expressões ou palavras têm, em Mirandela, a simbologia que lhes dão noutras terras. É esta diferenciação lexical que distingue esta obra de quatro autores Transmontanos da mesma geração. Não é um livro espalhafatoso, nem destinado à obtenção de graus académicos ou honrarias encomiásticas. Terá nascido num ambiente descontraído, à imagem de quem troca uns momentos de sueca, por algo mais telúrico e mais genuíno. Deram as mãos, distribuíram tarefas, puseram-se a caminho e desaguaram no porto, onde se recolhe a pescaria. Uma colheita reconfortante, esta que bafeja uma cidade da Terra Quente, próspera e a transbordar de cultura por todos os poros e por cada mais um filho que acorda com preocupações comunitárias.
Jorge Sales Golias, Jorge Lage e António João Lima Rocha, nasceram na
mesma década (1941-1948). Tiveram percursos académicos e profissionais
muito semelhantes, ânsia de saber mais e mais contributos legar à Terra a
todos comum. Um trio de eleição que pelo que já fizeram em proveito da
cultura, do ensino e da investigação, bem merecem os aplausos das Gentes a
que pertencem. O quarto co-autor, Hélder Rodrigues, nasceu em 1956 em
Macedo de Cavaleiros, mas com dois anos de idade, radicou-se com a família
em Mirandela, repartindo a residência por Carrazeda de Ansiães. Todos têm
formação académica superior, prática do jornalismo e com obras publicadas.
Bem pode dizer-se que este quarteto de ouro, coroou na passagem para a
idade do descanso que a todos é devido, a geração a que todos pertenceram,
com um mausoléu linguístico e literário que muito valorizam a cultura
portuguesa. A ajuizar pelos agradecimentos insertos nas pp 7/8, tiveram
outras pessoas a trabalhar nesta obra. Contributos que também beneficiam
quem os presta porque acordam para as realidades que de outro modo lhes
passariam despercebidas.
Jorge Golias que assina o prefácio e através do qual se depreende ter sido
o maestro, afirma que «se pretendeu reunir neste livro as palavras e os
ditos populares da região de Mirandela, urbana e rural, sobretudo da
primeira metade do século XX.» Nele se «dá conta das obras, nomeadamente
as de autores locais e vizinhos, que utilizaram algumas das palavras e
frases que identificámos. Consultámos diversos Dicionários para os
confrontar com as nossas conclusões de significação e de sinonímia, que
nuns casos coincidem e noutros não». E Jorge Golias nesta clarificação
preambular fala do quarteto e do seu papel geracional: «Os quatro autores,
mirandelenses, reúnem em si outras competências académicas e também
experiências de comparação com os falares do País de Norte a Sul, alguns
na rica experiência do ensino público». Ele próprio escreve, a terminar,
«que o objectivo desta obra não se fina por aqui. Outras versões deverão
surgir, completando e corrigindo a actual».
O volume em capa dura e graficamente executado no Diário do Minho, numa
tiragem de 800 exemplares, destaca duas partes essenciais: o Dicionário
com palavras, expressões ou frases de autores da região que elegeram para
palco das suas pesquisas. E os ditos populares usando o tempo do verbo que
exprime a fala e não o infinito.
É um exercício linguístico, a todos os títulos, louvável. A língua
Portuguesa é riquíssima, das mais faladas de quantos se conhecem e com
vocabulário variado e expressivo que dá para todos se expressarem, de
forma diferente, ainda que querendo transmitir mensagens idênticas. Se a
Língua Portuguesa se confunde com a Pátria, na expressão Pessoana, podemos
dizer sem complexos, que Portugal é uma Pátria preciosa, atractiva e
contagiante. Não diremos que dá expressão e elegância a um país rico,
porque anda ele pelas ruas da amargura, em termos económicos, políticos e
sociais. Mas outra coisa é a riquíssima roupagem com que dá visibilidade
ao seus falantes da Lusofonia. Não tem a língua, culpa dos erros socias,
das injustiças, dos atropelos, das picardias. E a prova destas evidências
são os ditos populares, as expressões, as frases feitas, os trocadilhos,
os dialectos, os próprios provérbios que dão para diluir a maldade de uns
e a bondade de outros.
Dos quatro autores tenho as melhores impressões. Uma dedicação quase
exclusiva à sua Terra e às suas Gentes, redescobrindo na cultura tudo
quanto dela possa extrair-se para glorificação comunitária.
Dá gosto ser transmontano e transportar na carteira esse bilhete de
identidade, como se fosse uma foto familiar. Jorge Lage é quem mais de
perto me acompanha e com quem mais tenho aprendido. Foi ele que me fez
chegar esta preciosidade. A ele e aos restantes Mirandelenses que tão
edificante obra produziram, aqui lhes rendo a minha homenagem de
Transmontano agradecido. E parabéns a Mirandela por acolher no seu seio
filhos gratos que tão bons préstimos têm dado à Terra lhes serviu de
berço.
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