Jogo de damas com castanhas
por Jorge Lage

Há algumas décadas escasseavam os brinquedos comercializados, especialmente nos meios rurais e ainda mais o pecúlio para os adquirir. Se em muitos lares não havia dinheiro para pão, como se podia pensar em comprar brinquedos?
Nesses tempos, as crianças brincavam especialmente com materiais (paus,
pedras, areia), frutos (castanhas, nozes, avelãs, bolotas, abóboras, pinhas,
maçarocas de milho), folhas e bugalhos, colhidos directamente da natureza. Com
folhas, frutos, paus e pequenos cacos, ainda hoje se joga às casinhas,
representando cenas da vida doméstica ou da imaginação criativa infantil.
A manufactura dos próprios brinquedos é já um jogo de construção, que
desenvolve a habilidade manual, a criatividade e o amor pela obra produzida.
Conjuntamente com nozes, bolotas, bugalhos, paus, cortiça e casca de pinheiro,
as castanhas são, no período em que abundam, dos objectos lúdicos mais
utilizados.
Delas nasce, após singelas operações (e com a ajuda de fósforos, palitos,
arame, lã...) quase tudo o que a criança idealiza: vacas, ovelhas, ratos,
caras de bonecas, mesas, cadeiras. Os ouriços, por sua vez, servem para os
miúdos manufacturarem insectos e porcos espinhos, enquanto que, com castanhas
e pedaços de casca, as raparigas concebem bonitos quadros, onde o castanho
realça sobre um fundo branco de linho, representando geralmente flores
silvestres.
De um rebento tenro de castanheiro, os rapazes fazem um dos brinquedos mais
apreciados: o assobio.
De uma vara de castanheiro faz-se um cavalo e pode-se cavalgar nas nuvens do
sonho, moldadas pela imprevista fantasia...
Nas regiões onde os castanheiros abundam, as crianças aproveitam os frutos e
os pequenos pedaços de tronco para construírem os seus brinquedos...
in Castanea - uma dádiva dos deuses, de Jorge Lage
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