Estória curiosa contada na autobiografia de Manuel Henriques Pires Fontoura
Manuel Henriques Pires Fontoura |
Ocorreram os factos no ano de 1947, segundo conta na sua autobiografia, o saudoso amigo Manuel Henriques Pires Fontoura, nascido a 12 de agosto de 1925, na vila de Montalegre. Manuel Fontoura foi meu vizinho, durante alguns anos, em Vila Real, onde com ele convivi, numa verdadeira e particular amizade.
“Um homem simples”, assim se intitula Manuel Fontoura na sua autobiografia. A estória é de igual modo carregada de simplicidade. Passou-se em Chaves onde Manuel Fontoura cumpria o serviço militar. Vou talvez acrescentar-lhe um ponto ou dois, sabendo que o meu amigo Fontoura de certo compreenderia, com um sorriso simpático de aprovação.
Tudo terá começado quando, após uma merendola bem comida e bem bebida, um grupo composto por quatro militares devidamente fardados se dirigia ao quartel, a pé, por caminho sinuoso de terra batida. Em dado momento, ficam os quatro em alerta com o ruído estranho de um automóvel que mais parecia querer avariar-se, tal era a irregularidade do andamento, ora acelerando, ora, logo a seguir quase parando no meio do caminho. Os quatro aproveitaram assim o movimento irregular do automóvel, para, levantando os braços, pedir boleia, de modo a chegarem a horas ao quartel.
Mas a coisa não aconteceu como esperavam. No meio do pára-arranca e do pó que do chão brotava em abundância, o condutor que viajava sozinho, pela janela, levanta também ele um braço com um gesto, que naquelas circunstâncias não poderia ser mais inconveniente. Bem, dois dos militares, entreolhando-se, e em rápidos movimentos, sacam dos bolsos bombas do Carnaval, já passado há uns dias, e atiram-nas para os lados do carro.
Pum, pum, pum… pum, pum...
É neste momento que, admirados, veem o automóvel disparar-se por aquelas curvas e contracurvas, escondido pela poeirada e a uma velocidade que não estavam à espera. Passados segundos nunca mais o enxergaram! Então, rindo-se todos pelo sucedido, e pelo susto que tinham causado ao condutor, continuaram a caminhada em direção ao quartel.
Lá chegaram com grande atraso, cansados do efeito da merenda e de tanto rir, sem se livrarem do raspanete do furriel de serviço – o Manuel Fontoura!
– Com que então a assustarem o desgraçado do homem - o “Trinca Arame” – diz o furriel, numa certa condescendência.
– Não me diga meu furriel. Esse que fabrica umas pedras de isqueiro de superior qualidade? Pois olhe, foi ele mesmo que nos vendeu as bombas. E até nos vendeu também umas caixas de pedras de isqueiro, por sinal muito bem fabricadas. Segundo nos disse, poderíamos voltar a vendê-las e ganhar um bom dinheiro com elas.
– Realmente já tínhamos ouvido que o homem tem a boca torta, de tanto cortar arame e só consegue rir-se para um dos lados, pois passa os dias a trincar arame em pedaços pequenos, e depois frita-os em óleo. A seguir seca-os, dando pedras de isqueiro que fazem chama à primeira, e costuma vendê-las em segredo aos imigrantes da Galiza que têm vindo ultimamente para Trás-os-Montes e para o Alto Douro trabalhar na agricultura.
Perante o disparate, o meu amigo Manuel Fontoura, após umas grandes gargalhadas, disse-lhes que tivessem juizo e dormissem, e amanhã estariam bem melhor.
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