Novo encontro na mesa entre o postigo e a única porta de entrada da tasca do lugar do Cimo do Monte
Combinações sobre o empreendimento e solicitação ao Tchico e ao Nanico, para ajuda ao reco do Ti Zé!
Passada uma semana desde a última vez na tasca da aldeia do Cimo do Monte, Tchico e Nanico juntaram-se novamente na mesa que se encontra entre o postigo e a única porta de entrada do estabelecimento.
Começaram então os dois a fazer uma espécie de retrospetiva a respeito das palrações da semana anterior, acerca do tal empreendimento que, segundo consta, terá a ver com cagalhetas ou algo parecido. O que é certo, de facto, é que o Tchico, como já informámos, é conhecido pelo Tchico da cagalheta.
Neste sentido, os dois homens entreolharam-se e interrogaram-se:
– Como é que os patrícios da aldeia já sabem mais que nós? Talvez alguém tenha dado com a língua nos dentes: ou o dono da tasca, ou então alguém mal-intencionado que tenha escutado a conversa do lado de fora do postigo.
– Chiça, mas, as noites já estão frias e isso não será muito provável.
Entretanto, enquanto se questionavam, e quando iam debruçar-se sobre o tema que têm para tratar e combinar, chega o proprietário da tasca com duas malgas de azeitonas embebidas em azeite e alho picado, mais duas canecas de meio litro carregadas do bom tinto, ponto de honra do estabelecimento do lugar do Cimo do Monte.
Antes que se expressassem outras presunções, Nanico adiantou-se na palavra, exclamando em tom grosso e expectante:
– Vem com ar de caso, ó Ti Zé!
Sem perder tempo, o Zé, o dono do estabelecimento, diz-lhes que a patroa, assim de repente, combinou já a data da preparação do fumeiro, com a rapariga que costuma ajudá-la no corte e “introlhamento” das carnes.
A rapariga de que vos falo, por acaso tem o nome da avó materna que se chamava Eufrásia, que já era o nome da madrinha da avó, e que pertenceria lá à aristocracia, como afirmam os mais velhos do lugar do Cimo do Monte.
Então, como a Eufrásia é possuidora de boas qualidades, é muito requisitada nesta altura do ano, sobretudo quando se trata de ajudar às carnes e ao fumeiro.
– E foi por isso – disse-lhes o Ti Zé – que me vejo obrigado, assim em cima da hora, a pedir-vos compreensão e que aceiteis na ajuda ao reco, já daqui a três dias.
O Tchico, num rompante, visto que a Eufrásia faria parte da empreitada, sem hesitações, respondeu prontamente por ele e pelo amigo:
– Ó Ti Zé, não se preocupe, carago! Eu e aqui o meu sócio lá estaremos, para aguentar o bicho.
O Ti Zé muito lhes agradeceu, dizendo que esta primeira rodada seria por conta da casa.
De modo que a conversa continuou naturalmente animada, mantendo-se o Ti Zé mais tempo do que o habitual junto dos comparsas!
Nota: a palavra "introlhamento" não existe no dicionário de Língua Portuguesa. Contudo, existe a palavra "trolha" que, em Trás-os-Montes, pode também significar utensílio afunilado por onde se introduz a carne nos enchidos.
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