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Encontro no Farol XVI

Finalmente, um beijo! Mortificada pelas agruras da vida e pelo cansaço dos anos, apoiada na bengala, curvada pelo sofrimento, aquela velhinha consegue manter uma réstia de felicidade luminosa no seu rosto. Sentada num dos bancos da frente da igreja, alta e espaçosa, maior que a igreja da sua aldeia, espera a sua vez para a confissão.

Encontro no Farol XV

A luz do farol Parece que o mundo tem, inevitavelmente, uma apetência desencorajadora do que é contrário ao sincero e à sua normalidade e que, o aspecto diplomático, fazendo já parte de um processo, como que natural, serve de coluna vertebral e como suporte para a maioria das decisões determinantes dos caminhos universais do ser humano. 

Encontro no Farol XIV

A procissão como pretexto O Manel e aqueles três, lá vão cambaleados, já noite. A procissão continua a ser o pretexto para os desabafos que o vinho origina. Anestesiados, perdem a noção do tempo que passa. Esquecem-se mesmo do tema que discutiram horas a fio. Esgotam-se no choro inebriado desta noite estrelada de fim de Agosto e lamentam-se dos obstáculos da vida. Apesar destes obstáculos, e dos culturais, um raio de luz orientador surge sempre, independentemente das convicções e conceitos religiosos em que cada indivíduo se situa.

Encontro no Farol XIII

O Manel da Quinta O Manel da Quinta, caneca na mão, desunha-se em berros entre a porta e a rua, gritando, espumado:  — Não ajudo ao andor se o raio do padre não passar a procissão pela minha rua. Nem eu nem os rapazes que tenho lá em casa. 

Encontro no Farol XII

O trajecto da procissão Os Verões são motivo de esperança para esta gente. Este ano, o padre novo traz consigo ideias também novas. A procissão da festa em honra de Nossa Senhora das Graças que se realiza todos os anos no segundo Domingo do mês de Setembro percorrerá agora uma grande parte das ruas, ao contrário dos anos anteriores em que se ficava pelo adro da igreja.

Encontro no Farol XI

Luísa, enérgica como sempre A hora da refeição aproxima-se e há que escolher o sítio mais escondido do sol abrasador. A sesta é inevitável. No mesmo banco em que se comeram as batatas regadas em bom azeite, pende-se agora a cabeça sobre o peito, reforçando a papada.

Encontro no Farol X

Ritual diário A manhã está a meio e o calor já aperta. As bestas, não lhes basta o carrego em cima, têm que aguentar ainda com as moscas, atraídas pelo encodeado nas virilhas dos animais. Servem-lhes de sossego o ramo de giestas que o moço, descalço, vergasta sem parar. Seguindo o percurso inverso da madrugada, o ritual diário continua, perdura no tempo, trespassando, com os mesmos métodos, diferentes gerações.

Encontro no Farol IX

A mina do olmo O Ti João continuava dizendo que a mina existe ali, já há muitos anos, e nunca falhara com a água. A mina do olmo é a grande fonte da terra. Bebe-se dela, dá-se aos animais e regam-se as novidades. Estas palavras são ditas e reditas desde sempre. Servem como farol incitador de coragem e indicador de caminhos trilhados pelos sulcos, veios de transmissão do suor e transportadores de alimento. Os sulcos, apesar de suavizados pelas melhores intenções, actuam como se de placas tectónicas se tratassem, adormecidas às vezes, e por longos períodos de tempo, mas com uma grande capacidade de despertarem nos momentos menos esperados. Encontro no Farol X - Ritual diário

Encontro no Farol VIII

Ti João da Forja O tempo é lento na aldeia. Este ano o calor começou mais cedo. Nesta época, trabalha-se desde as quatro horas da manhã, pela fresca. Os homens levantam-se e encontram já as mulheres com o farnel pronto.

Encontro no Farol VII

Menina traquina A Luísa, apesar do seu ar sisudo, tinha um sorriso sempre especial para a menina, menina traquina, como também lhe chamava. Esta, por sua vez, desdobrava-se em brincadeiras, sempre à distância suficiente para que não lhe roubassem um beijo.

Encontro no Farol VI

Pouco diziam uma à outra A Luísa, precisamente dez anos mais velha, relembra a vinda da Francisquinha, ainda ao colo da mãe, quando o pai, o agente Figueiras foi transferido para estas paragens. Quatro anos passaram desde essa altura. Tanto tempo para a Luísa que aspira a fazer 18 e ainda faltam outros quatro. Uma eternidade!  Pouco falavam. Pouco diziam uma à outra. Acenos, risos e correrias eram as principais e quase únicas formas de comunicar entre as duas. Encontro no Farol VII - Menina traquina

Encontro no Farol V

Francisquinha Logo de seguida, olhos fixos na correria, sai-lhe a voz rouca de quem já não conversa desde o almoço. Mas repete com firmeza o nome da menina que entra pela porta da casa mesmo em frente:  — Francisquinha...!  A Francisquinha é filha única do agente da Guarda Fiscal, em serviço no posto fronteiriço, a uma boa hora e meia de caminho. Já sabe escrever o nome completo e para o ano fará parte de um grupo de crianças que, pela primeira vez, se sentarão nos bancos da escola nova, já construída. Encontro no Farol VI - Pouco diziam uma à outra

Encontro no Farol IV

Luísa Num destes mochos, madeira grossa de castanho, sentada no que de mais profundo há no pensamento, ponteando atarefadamente, mexendo agulha e lã, cortando com os dentes o fio, enérgica, a rapariga levanta os olhos instintivamente para logo baixá-los de novo, desta vez com mais energia, um certo ar de quem não vê o passeante novo que tira nabos do púcaro à vizinha, três casas acima.

Encontro no Farol III

Conversas banais A rua mais estreita que desemboca na praça é rica pela diversidade e qualidade textural das superfícies. Inspiram artisticamente a mente pela variedade e riqueza de tons, cinzentos mas que transpiram movimento e vida. Tons que raramente se encontram e dificilmente se compõem.

Encontro no Farol II

No jardim da praça Na aldeia pacata, quase sem nome de tão longe, não para os seus habitantes, muitos, os que constroem, multiplicam, trabalham e inventam, nem a distância consegue retirar-lhe a beleza e prosperidade. Entremos pela rua principal, direitos à praça, centro da aldeia. Repare-se no terreno onde existem árvores, flores e plantas, servindo para adorno do jardim. Espaço agradável, fresco pelo oxigénio exalado, belo aos olhos e a todos os sentidos.

Encontro no Farol

O vocábulo farol De acordo com o estudo etimológico, o vocábulo farol tem uma dupla proveniência, do Grego e do Latim, respectivamente, Pháros, Faro, ilha do delta do Nilo e Pharu. O seu significado relacionado com construção para o alto em forma de torre, para a grandeza do oceano, advindo daqui a ideia de infinito, pressupõe não só o lado indicador, mas também o lado luminoso, ambos com base numa linha de orientação imediata e visível, ou então, misteriosamente oculta, mas sempre voltada a um sentido profundo de compreensão, às vezes difícil de atingir, não pela sua transcendência, mas pela recusa de abertura a essa mesma transcendência. Encontro no Farol II - No jardim da praça

Gestão danosa do empreendimento

Certificados de que às ovelhinhas tinham passado as mãos pelo pêlo e a eles surripiado a ideia do negócio, esmorecidos, decidem voltar à serra que os criou na convicção de que os animaizinhos já não eram o mesmo que dantes. Como remédio, assim pensaram, deveriam passeá-los nos montes para voltarem a ser vistos com posturas ousadas, ao contrário do ar pasmado que exalavam e aprenderam nas salas do palácio ministerial. Nem sequer se preocupavam já com a gestão danosa do empreendimento, muito menos pensavam nas prometidas ajudas entretanto ardilosamente desfiguradas.

Execução do plano da cozinha

Assim aconteceu: naquela noite, apagados os lampiões do palácio, sem pregar olho mas bem despertos, o dono do rebanho e o seu amigo e sócio dão início à execução do plano que haviam traçado. Dirigem-se sorrateiramente ao local onde julgam tudo se passará com as caganitas que entretanto faziam rir desregradamente um dos motoristas, pelos vistos metido diretamente na marosca.  Entrados no amplo espaço da cozinha, rapidamente reconheceram o perfume da patroa que gere as comidas do pessoal ministerial. Seguiram-lhe o rasto pelo odor e foram encontrá-la àquela hora da noite junto a uma porta que liga a cave da cozinha à sala onde as ovelhinhas e seus maridos se encontravam, finalmente sob os olhares dos dois, estupefactos.

Desconfiados da chefe da cozinha

Descomprometida, naturalmente atenta às lidas diárias da cozinha daquela secção do palacete, sem que doutro assunto tivesse necessidade de tratar para além das couves e nabiças com quem tinha de manter um bom relacionamento, seria a atitude que esperariam presenciar na chefe das empregadas. Mas não. A senhora, sempre que tinha de passar pelas escadas para se dirigir à horta e consequentemente avistar-se com aqueles dois que nunca mais resolviam dali abalar, mostrava uma certa postura de inquietação com olhares a desviarem-se para a janela do escritório onde os motoristas decidiam sobre as suas idas e vindas, procurando afincadamente no mapa roteiros que teriam de seguir, segundo as ordens de baixo a que estavam submetidos.

A fusca e a malhada

A "fusca" e a "malhada" são os nomes dados às ovelhas mais importantes do rebanho, digamos assim, de estima especial, pois são as mais velhas e as que mais têm resistido com paciência à rudeza dos montes por onde pastam. Para intriga dos dois empreendedores que se erguiam de mais uma noite nas escadas, apenas aquelas permaneciam no curral do palácio. Conforme o motorista hoje de serviço, as restantes estariam em local apropriado de identificação e em fase de apuramento dos seus estados físicos e psíquicos através de exames e avaliação médica.

Nas escadas do palácio

Sentados nas escadas do palácio, Chixe e Nanixe ali despontavam do sono, como em noites semelhantes de que se lembravam e estavam acostumados. Após o esfrego dos olhos, começaram a avivar as memórias e perceberam pela azia sentida a raspar-lhes as narinas que a noite, não sendo confortável, serviu-lhes de descanso por força das bolachas com que se refastelaram, acompanhadas do doce palheto. Só por isso valeu a pena o esforço e a viagem que, com as suas ovelhinhas e maridos, fizeram, apesar de um sentimento esquisito de rejeição por parte do distinto chefe de gabinete e sua secretária que aproveitados da anestesia do momento os remeteram à insignificância das escadas do palácio. 

Chixe e Nanixe recebidos no ministério

Depois do contratempo da autoestrada que obrigou as ovelhinhas e seus maridos a viajarem de camioneta com destino à capital, nada disto fazendo parte das contas previstas por Chixe e Nanixe, estes até nem deixaram de apreciar a situação, sentindo-se honrados pela ajuda prestada pelas tais organizações, de que demos conta em artigo anterior, acostumadas a ações de benfazer. Apesar de viajarem em camionetas separadas por imposição das autoridades, acabaram por concordar, até porque pelo caminho foram apresentando as ideias ao motorista encarregado de os transportar, motorista esse também guiador do carro do ministro com quem tinham planeado conversar. Assim, as coisas, ao acaso, corriam de feição.

Rebanho na autoestrada: primeiro alerta

Passou algum tempo e os dias sucederam-se silenciosos e sem novidades sobre o já célebre empreendimento da caganita. Alguma cochichada, no entanto, escorre dos bancos e cadeiras do café central, local escolhido anteriormente para algumas reuniões sobre o assunto ao qual não têm comparecido os dois empreendedores. Estes, como tivemos já oportunidade de concluir, têm-se escusado a transmitir aos seus admiradores as novas de entusiasmo acerca do projeto que ultrapassou já as fronteiras da região e tem mesmo sido objeto de notícia e programas alargados da televisão da capital.

Rebanho a circular na autoestrada

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